Paisagismo Social
Habitar tem vários sinônimos técnicos. Mas poucos se referem ao habitar como coexistir com o meio ambiente, mesmo no contexto do mundo globalizado e tardiamente preocupado com a idéia da sustentabilidade.
O bairro Guarituba, no município de Pinhais é um desses lugares onde o habitar tem vários sentidos, dentre eles, o de “sub-existir”. O suporte físico extremamente frágil é um dos sinais de que, a rigor, não deveria haver a presença do homem urbano por lá. Não obstante, uma vez que pressões diversas levaram à ocupação, é a vez do paisagismo, como ferramenta da relação entre o homem e o meio natural, entrar em cena para demarcar uma fronteira, descrever um limite.
O ideal proposto para as áreas de interesse, que são constituídas por quatro parques (Linear, Mandi, Lambari e Acará), segue a discussão da relação das cidades e suas fontes de água, e conclui por este raciocínio: impor um limite à ocupação do homem, enquanto dá a ele razões para coexistir com este ambiente frágil e peculiar, sempre utilizando a água como elemento organizador, e como um ícone da essência desta relação.
Cada parque recebeu um tratamento que embora individual, o conectava a todo o contexto através do uso de uma mesma linguagem estética, e da mesma paleta vegetal.
O parque linear, ao longo do canal, tem como objetivo proteger as margens do Canal a serem desocupadas, num esforço para impedir sua poluição e o depósito de lixo. Aproveita a presença da água e desenvolve em sintonia com o curso do canal, uma ciclovia e uma via para pedestres, interpolados por árvores e espaços de permanência como playgrounds e decks para convívio. Lança mão da presença de um farol/mirante como um dos elementos verticais propostos para contrapor a visão horizontal da região, enquanto na escala do pedestre seus caminhos se fundem ao sistema viário local. Um desses bulevares leva à uma pequena Estação de Tratamento de Água cuja intenção é apresentar, principalmente à população mais jovem, a importância de não poluir e de conservar as águas. Funciona também como um espaço que resgata o lazer familiar, com quiosques e churrasqueiras, não usadas sem regras de boa-convivência com o meio ambiente.
Planta do parque
Imagem: Mauricio Kilo
O parque Mandi comporta-se como o centro nervoso do projeto, abraçando a Rua das Andorinhas que faz a ligação física entre todos os parques, compondo assim um sistema. Cortado em dois pela nova avenida com um canal extravasor, tem a instalação prevista de estufas e de áreas de plantio, onde serão cultivadas com participação da população local as plantas e flores que serão plantadas em todos os demais parques. Esse parque também comporta a área de compostagem, feita elevada do solo de forma que os resíduos gerados não o contaminem e cheguem próximos ao lençol freático que é bastante superficial na região. A matéria orgânica resultante também é aproveitada na adubação dos parques do sistema. Toda essa estrutura tem uma ligação íntima com a educação ambiental e a exploração de soluções alternativas, tanto dos moradores locais quanto dos visitantes.O parque propriamente dito é um lugar de convívio, com grandes áreas livres e a presença da água. Estão previstos no projeto um mirante central, uma praça de eventos e o museu das águas, que terá um apanhado da relação do homem com a água ao longo da história. Sempre buscando o contato e o apreço primariamente da comunidade.
á o parque lambari tem um caráter urbano, dado sua situação entre duas importantes vias de distribuição: a Rua Betonex e a Rua das Andorinhas. Localizado próximo à escola local, o parque é estruturado de forma a oferecer à comunidade um suporte adequado à prática esportiva. Esta já é a vocação vernacular do espaço, onde está improvisadas áreas de lazer de crianças e jovens para prática de esportes. O projeto propõe uma organização multi-esportiva, resgatando a dignidade da área sem tomar da população o uso que já designaram à área.
Assim, estão propostos campos de futebol, quadra coberta e uma pista de atletismo, sempre cercados por vegetação abundante e pela água que definem o local.
Planta do encabeçamento do parque linear junto á rodovia PR415
Imagem: Mauricio Kilo
Por fim, o parque Acará é o lugar mais introspectivo do conjunto, com maior presença de árvores e de espaços para lazer voltados à atividades como a contemplação, a conversa e o contato com a natureza. Tem maior caráter naturalístico, com seus caminhos ligeiramente elevados, intencionando a quebra com a velocidade e o cansaço do mundo apressado em que vivemos. Busca o verdadeiro sentido do humanizar, ao entrar em consonância com o meio natural. Possibilita, a exemplo do Parque do Mandi, eventos de Educação Ambiental, como visitas de grupos de estudantes para conhecer e aprender com a natureza, e para usufruir do Farol do Saber equipado com livros e material direcionado ao estudo ambiental, à ecologia e à preservação. É no Parque do Acará que nasce o canal central da Rua das Andorinhas, projetado com a dupla finalidade de tanto ressaltar a quem passa que a água está ali e faz parte do seu dia-a-dia, quanto ser o extravasor de águas e direcioná-las ao rio.
Como já foi dito, o sistema viário local serviu para unir os parques, e seguindo os parâmetros da própria Cohapar, também foi desenhada a proposta para a arborização e urbanização das ruas, com canais de drenagem onde era necessário, e uso exclusivo de espécies nativas (como em todo o projeto).
Planta do parque
Imagem: Mauricio Kilo
O projeto foi um desafio, visto que os problemas da região eram reais, e por isso a tônica escolhida para orientar as decisões do projeto foram questões de ordem social, a busca de como fazer o morador local se apropriar e cuidar dos parques. Por isso a insistência em atividades de educação, orientação, a criação de espaços familiares e de cultivo, direcionando o uso além do simplesmente expositivo, para um apoio à real melhoria da qualidade de vida da população local.
ficha técnica
Título
Paisagismo social
Autores
Mauricio Kilo, Gabriel Daudt, Flora Santos, Thamile Franzini e Shaiany Ferreira
Orientador
Prof. Dr. Paulo Chiesa
Instituição
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Paraná